Créditos: OpenAi

O avanço nos sistemas de telecomunicações, mais precisamente nas comunicações via internet, tem proporcionado a seus usuários uma comunicação instantânea por todo planeta e com baixíssimo custo financeiro. Esta nova realidade gera grande impacto econômico pelo modo de interação rápida entre todos os participantes da rede, dos consumidores, cidadãos, a empresas e os governos.

Como falado no texto anterior, a segurança jurídica nas relações cibernéticas tem sido um dos grandes entraves para atingir o potencial de eficiência que a tecnologia é capaz de fornecer. A identificação das partes envolvidas numa relação jurídica digital é questão primordial para conferir segurança aos documentos eletrônicos. A mera identificação lógica pode apenas estabelecer uma presunção de correspondência com um determinado equipamento ou com um grupo de usuários[1], como por exemplo, no caso de uma simples autenticação (login) de uma página web da internet. Cabe a ciência jurídica e o corpo legislativo de cada Estado definir e determinar uma base legal regulatória afim de promover um ambiente cibernético seguro e justo para os usuários.

A identificação pessoal no ambiente cibernético de forma segura tem sido possível através do uso de segredos, ou seja, algo que apenas o usuário conheça, como é o caso das senhas; ou algo que só a pessoa possua, como a impressão digital, a imagem da íris, os cartões com chips (smartcards) e tokens; ou ainda através de algo que somente a pessoa seja capaz de fazer, como o tom de voz, a maneira como escreve no teclado e com uma caneta[2]. Para doutrina jurídica clássica, o conceito de assinatura eletrônica vem a ser um sinal distintivo, próprio do autor da assinatura, pelo qual a pessoa se torna conhecida em relação aos outros[3]; sendo assim, a tecnologia através da assinatura digital é capaz de determinar, com alto nível de segurança, a identidade digital do usuário, e o mais importante, a baixíssimo custo financeiro.

Créditos: OpenAi

Assinatura eletrônica qualificada, ou simplesmente assinatura digital, baseia-se em sistema de certificado digital de chave pública emitido por uma autoridade certificadora com uso de métodos de criptografia assimétrica. Desta forma, a criptografia aplicada em conjunto com o certificado garante a autenticidade do autor e a integridade do documento, ou seja, garante que o documento foi realmente assinado pelo seu autor e que não foi modificado após a oposição de sua assinatura. Vale desatacar que devido a forte criptografia usada, a confidencialidade do documento também pode ser assegurada. Com todas estas seguranças técnicas aplicadas, as legislações normatizadoras vêm a conferir o não-repúdio ao documento assinado digitalmente, ou seja, impede uma eventual futura negação do referido ato por parte dos signatários.

Conforme o Regulamento 910/2014 da União Europeia, a assinatura eletrônica qualificada baseada em certificados digitais emitidos num Estado-Membro tem efeito legal equivalente a assinatura manuscrita e deverão ser reconhecidas como tal em todos os 28 Estados-Membros. Em Portugal, o Decreto-Lei 290-D/99, modificado por força do referido regulamento, confere força probatória ao documento eletrônico quando lhe seja aposta uma assinatura eletrônica qualificada, ou seja, uma assinatura digital baseada num certificado qualificado por uma entidade certificadora credenciada, fazendo assim prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor, conforme artigo 376º do Código Civil português.

No Brasil, a Medida Provisória 2.002-2 de agosto de 2001, editada com força de Lei, foi a legislação inaugural da assinatura digital instituiu a estrutura de chaves públicas brasileiras ICP-Brasil. Outro importante dispositivo, é o artigo 411 da Lei 13.105/15, Código de Processo Civil, que estabelece a autenticidade do documento quando “a autoria estiver identificada por tabelião ou qualquer outro meio legal de certificação, inclusive eletrônico, nos termos da lei”. Logo, o próprio CPC brasileiro confere presunção de veracidade ao documento assinado digitalmente da mesma forma como o documento certificado por um tabelião, a quem é delegado o exercício da atividade notarial e de registro como Oficial de Cartório, seja de notas, de protestos ou de registros públicos (Lei no. 8.935/1994).

Agora, quase 20 anos depois da MP 2.002-2, entrou em vigor a Lei 14.063 em 23 de Setembro de 2020 que normatizou o uso das assinaturas digitais classificando-as em três tipos, as simples, as avançadas e as qualificadas, seguindo a mesma classificação do regulamento europeu. Atribuiu-se assim, o nível mais elevado de confiabilidade de identificação às assinaturas qualificadas que mantêm o padrão de segurança da estrutura ICP-Brasil de emissão do certificado digital por autoridade certificadora (AC).

O Superior Tribunal de Justiça – STJ já havia formado entendimento nesse sentido mesmo antes da vigência da Lei 14.063/20, a exemplo do seguinte acordão da Terceira Turma, o qual garantiu validade de contrato eletrônico de mútuo assinado digitalmente pelas partes e com dispensa da assinatura de testemunhas, pela tamanha segurança jurídica que a tecnologia confere aos contratos assinados digitalmente através do certificado emitido por uma AC ICP-Brasil, vejamos a seguinte ementa: 

“RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL.  EXECUTIVIDADE  DE CONTRATO ELETRÔNICO DE MÚTUO ASSINADO DIGITALMENTE (CRIPTOGRAFIA ASSIMÉTRICA) EM CONFORMIDADE COM A INFRAESTRUTURA DE CHAVES PÚBLICAS BRASILEIRA. TAXATIVIDADE DOS TÍTULOS EXECUTIVOS. POSSIBILIDADE, EM FACE DAS PECULIARIDADES DA CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO, DE SER EXCEPCIONADO O DISPOSTO NO ART. 585, INCISO II, DO CPC/73 (ART. 784, INCISO III, DO CPC/2015). QUANDO A EXISTÊNCIA E A HIGIDEZ DO NEGÓCIO PUDEREM SER VERIFICADAS DE OUTRAS FORMAS, QUE NÃO MEDIANTE TESTEMUNHAS, RECONHECENDO-SE EXECUTIVIDADE AO CONTRATO ELETRÔNICO. PRECEDENTES” STJ- REsp 1495920 / DF RECURSO ESPECIAL 2014/0295300-9 Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO – TERCEIRA TURMA (grifei)

Fica assim demonstrado que a assinatura digital baseada em certificado digital emitido por entidade certificadora credenciada promove o mesmo nível de fiabilidade na União Europeia e no Brasil; o que vem a garantir segurança jurídica aos usuários na gestão de contratos e demais documentos eletrônicos. Portanto, é de fundamental importância a adesão a essas novas tecnologias pelas empresas que buscam segurança jurídica, eficiência econômica e competitividade para permanecer operando no atual cenário de grandes transformações digitais.

[1] Erica Brandini Barbagalo, Contratos Eletrônicos, (São Paulo: Editora Saraiva, 2001), 41

[2] http://www.sos.state.az.us/pa/SigDinamicsCP.pdf

[3] Francisco C.P.Andrade, “UNIO-EU Law Journal. Julho 2018, pp 103-112”